segunda-feira, novembro 26, 2007

Braile



Tenho os sentimentos acostumados à largura de tuas ancas. Querências me chegam com fartura e calor. Quando alguém planta um olhar no meu, e só sei cultivar com fé e esperança, logo logo vislumbro os frutos. Nutro o que há de melhor em mim...e por vezes, feito hoje, contemplo minha paisagem devastada. Mas, tenho aprendido a fechar os olhos, em meio a multidão, e dançar no meu ritmo, pra mim. Viver me desacomoda.
Nada sobrevive exposto demais ao sol... vai se exaurindo em ardências, exausto...ressequido.

Aprendi a me refazer em teus braços. Em dias assim, ainda me sinto retardar os passos só pra conter o choro. Até te alcançar. Eu só sabia me deixar doer em teus braços. Ía inspirando rápido e profundamente como quem teme o escapar da vida num soluço. Depois, nem temia mais. Soluçava doído. De quando em quando, parece tão impossível continuar a viver. Aí, um desejo de árvore rompe o asfalto.
Deitar no teu colo era pairar os pensamentos. Nos meus cabelos moram a saudade do encanto dos teus dedos. Teu carinho contava histórias... Pra escutar com a pele é preciso fechar os olhos. Dos teus dedos, ouvi:

- Feridas na epiderme da alma deturpam os sentidos.
- O choro é pro coração devastado não conhecer desertos.
- O pensamento fecunda o ar e gesta palavras. O falar tem legitimidade de filho e desejo de vôo.
- Cada palavra ganha significado na boca.
- O tempo vai mudando a palavra por dentro, o amanhecer a cada dia faz seu significado.
- Toda impressão traz muitas digitais.

Uma lágrima com suavidade reaviva na pele teu toque. O que tem de fundo em mim, bem sei, bebi do teu olhar. Hoje, me recolho. Contraio o corpo e perco a pressa. Não quero aguardar mais por quem se demora uma vida inteira em frente ao espelho. Estou em reformas. Mantenho as colunas, derrubo as paredes, me desfaço de tudo. Não gosto de me segurar no que sobrou. Não alimento minhas mendicâncias. Tudo que sobra, ainda assim, é falta.

Gosto das perdas que me tiram tudo. Pra sentar em mim, olhar ao redor, e ficar. Até redescobrir em mim força e possibilidades de recomeçar. Tudo que vivi já me ampliou os vãos de dentro, e tanto, que me sinto tão menor em mim. Mas, com espaços para crescer. Silencio. Tudo que quero dizer está na ponta dos dedos.
Cecília Braga

sexta-feira, novembro 16, 2007

In un Baleno (Num piscar de olhos).





Todo meu descanso é no azul, e só. As minhas pernas se estiram nos horizontes.
Meu andar é na entrelinha, céu-mar.
Por espanto, eu sabia: caminhar é só uma questão de me sentir mais à vontade com meus desequilíbrios.
Prossigo, mesmo sendo corda-bamba.
Vezenquando, uma pomba corta rasante os pensamentos.
Dos deslumbres: as idéias ficam suspensas... Em teima de vôo. Em deleite de mergulho.
Nem um suspiro me aquieta mesmo quando, de tão alto, inalo nuvens.
Tenho esse vento frio na altura do estômago,
coração apertando, o corpo trêmulo... Chuva guardada. Deve ser.
Tem coisas que se pensando, logo concretizam...
O tempo não tardou a se fechar nos olhos,
tanto pensamento de medo, trovejando.O corpo fazendo calafrios.
Dessas coisas que vêm junto com febres. Avisos e alertas.
Chorei logo um mar inteiro. Pra mudar essa paisagem de deserto.
E porque não sei ser aos pouquinhos.
O jeito foi pegar cajado e intimidades de Moisés com Deus, e caminhar mar adentro.
Pra espalmar minhas mãos de angústia no azul. Como quem se ampara, e evita quedas.
(Dos segredos: Deus gosta de engabelar o espaço: Amarra a linha do tempo nos dedos, faz ioiô do sol:
diiiiaaaaaa-noiiiiiteeeee, diiiiiaaaaa-noiiiiiteeeee...).
Aí era tarde, tinha caído já...essa coisa de espaço, só não sabia. Ainda não.Só com o tempo...
Sabendo de mim, ele sorriu. Encostou também sua destra no azul, que de angústia ele bem entende.
Dos fatos: Tínhamos tantas cores de sentimentos nas mãos, misturadas,
que rasuramos melancolicamente o azul. Pintamos um pôr-do-sol...
Das sacralidades.E são tantas.
Deus é menino. E tem todas as idades...Das lições.
Fechei os olhos em prece, só pra ascender por dentro essa noite.
Um mantra desenha o movimento dos ventos. E o cabelos cantam.
Sento entrenuances, ritualisticamente sansei. (como quando algo me revela).
O peito entregue, cede. E sinto o coração estremecer entre joelhos.
(Desses instantes em que os sentimentos nos tiram as firmezas, e a gente se dobra).
E me penso...(por que há dias que quero ser tão outra...logo passa).
Das manias: só sei me dissolver no instante, extática.
Sendo parte, construir possibilidades de me saber inteira.
Das posses: sou dona de todo um desajustamento, muitas instabilidades e de um querer-com-todo-ser.
Das aprendizagens, ou das possibilidades de.
:Querer-colocar-o-outro-na-medida-da-expectativa viola os direitos dos deslimites do ser.
E distancia o amor.
Das dificuldades: pelejar com minhas carências, e suas manias de grandezas.
O tãopouco parece demaisdaconta. E a pessoa aqui, padece. Mingua, por escolha.
Das constatações: essência tem dimensões, em número de 10 (é universo quântico), e intensidades.
De quase todas minhas impossiblidades: acorrentar um gesto, dissimular um querer, sufocar uma palavra,
pôr limites na entrega, viver raso e me fingir feliz.
Do que por si só, não adianta: O atrito de corpos.
Mesmo que tenham a ancestralidade guardada de quem re-descobre o fogo.
É preciso tão mais para me aquecer.
Das entregas: só conheço a que se inflama na fé. Daniel nas labaredas de fogo.
Na boca, o canto...glórias, aleluias, jubilos.
Ameninando medos, lamentações, dores e dissabores.
Só assim as feridas não me lesam. E as cicatrizes me desenham inteira.
Das seduções: as naturalidades.
Das esperas: a sua, porquê ando cansada...
Meu corpo quer se propagar no seu, inscrever meu movimento que é de permanências. Quero dispor da vida que ainda me resta pra te apreender, sem jamais te saber conhecido. Vem, que tenho um universo em mim a ser explorado... e têm me pedido tão pouco, que por vezes esqueço. Deita tua racionalidade nos meus braços, que a música em mim tem ritmo hindu. O tempo se conta no piscar dos olhos, na batida do coração. Vem, que meus olhos nos seus tem duração de presença. E fica. Pra minha poesia ganhar vida em teu corpo.
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Cecília Braga


12 meses de.
(De quando as palavras não alcançam).
Dos desejos: todos soprados ao vento...
Das preces: todas que vocês quiserem tecer.
Amém.

 
'é tempo de me fazer, eu sei'.
Caio Fernando Abreu.