domingo, maio 20, 2007

Êós - Deusa da manhã

É devaneio, sim.
Tuas mãos surpreendendo meus olhos.
Repousam sobre eles.
Meu olhar de lua cheia, tuas mãos de sol tecendo eclipse.
Passeio minhas mãos sobre as tuas num medo alegre.
Meu dedos envolvendo com força os teus. Aperto.Temo e tremo.
Os anéis de Saturno atravessados na garganta, embargando a voz.
Essa coisa sem pertencimento vagando no estômago feito Plutão.
Minhas mãos afastando de-va-gar as tuas, sem perder a órbita.
Afasto um a um os teus dedos escoando aurora.
Meu olhar perdido no traçado rósea da palma de tua mão, nele o alvor do dia.
É que sonhei com Primaveras.
Mas, aqui dentro um Outono calado.
Um amarelar das coisas antigas. Guardadas.
Fotografia de tempos atrás revelando sonhos realizados somente ali, no castanho dos olhos.
Tão claros, meu Deus.
Ouço ao longe o vento pastoreando nuvens...
Aqui terra seca de tanto verão tem sede.
Da vida e das estações só se alcança compreensão nos seus contrastes.
Shiva dança. Marca no passo o ritmo do tempo.
E no movimento das mãos abre e fecha ciclos.
Chove.
O sol em outro hemisfério. Inverna a alma.
Bem sei apreciar a beleza de cada estação.
Eu só queria caber no seu abraço mesmo quando
o tempo esquenta o corpo, mas só outro corpo aquece a alma.
Na Gênese que toda noite escura prenuncia eu só queria teu hálito fresco de manhã soprando vida nova em minhas narinas.

Da poesia que você trouxe para os meus dias declamo aqui meu último verso.
°
Cecília Braga


quarta-feira, maio 09, 2007

Mare

Só o som da areia bebendo um tanto de mar calmo
e dos passos do vento ondulando a superfície das águas claras,
assanhando o verde, remexendo na areia...
Guardando o canto do mar nos búzios.
Escrevo algodão em papel azul celeste.

Eu só queria teu olhar perdido em minhas palavras,
feito olhar de criança embebido de céu,
deitada no mar, flutuando.
E que o vento te dissesse da suavidade do toque que tenho guardado.
E aguardado...
Meu canto doce posto em envelope,
segura nas mãos como criança que encontra búzio na areia.
Tesouro.
Aproxima dos teus olhos surpresos. Leva junto ao peito.
Coração se faz ouvido.Abre.
Menino encantado escuta sinfonia dizendo de mar...
e dessas imensidões
Minha espera é azul
e o sal não incomoda tanto...
Sei que tuas palavras molhadas hão de me encontrar...
sedenta.
*
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Cecília Braga

quinta-feira, maio 03, 2007

Adámas


Dos dias que a palavra ríspida marcha dentro do peito.
Das coisas que não se digere. Do revirar no estômago.
Do alvoroço dos pensamentos todos.
'Minha pátria é minha Língua'.
Sim, sim. Caetanear a prosa.
Pensamento numa lonjura aperreada.
Território, liberdade, propriedade e coisas que entendem as membranas. Cerca viva.
Corpo cansado dessa atmosfera bélica, de vaidades tolas, de desenhos de giz. Efemericidades que a menor chuva leva vestígios, todos.
E mesmo ao maior sol...
Vai ardendo os dias no passar ligeiro do tempo, pra quem quer demora. Ou no demorar do passo, pra quem tem pressa. Queima tudo. Fica a dúvida. Medonha.Se existiu mesmo. E só. Feito lembrança de pesadelo amargando a boca, depois que acorda.
Encontros forjados. Gentes que planejam, invadem e se apropriam. Sedução Vampiresca. Apois. Daquelas que se diz bem sexy, entre sorrisos, os mais cínicos, quase a cravar os dentes no pescoço arrepiado do tanto querer, e do medo se depois de. Haverá.
: - Lembra do primeiro instante? Diante de sua porta. Teu ser inteiro vibrando na certeza do sim... a casa é sua. Pode entrar.
Ah, meu avô! Como é que o olhar deixa de ser de onça em situação dessa magnitude?! Deixa não. Individualidade é espaço sacro. E tem gentes profanando. Que essa coisa de ser Imagem e Semelhança, é de Criador. de criatura não.
Criatura cabe ser bandeirante no território do próprio ser. Tarefa de vida inteira que se deixa inacabada. Terra vasta. E Santa.
Tá no Eclesiástico: 'Boca fala do que o coração está Cheio'. Acredito sem duvidar vez nenhuma que fosse. Linguagem é simbolismo vivo. Verbo que se faz carne. Palavra de fé removendo montanha. É palavra de profeta construindo futuro. Escrita dizendo da mão de quem escreve. Gesto proferido é desenho ímpar.
Adianta não. Ouro de Tolo enche os olhos de quem tem visão prejudicada. Imagem presa na retina de bailarina linda, sensualidade na dança, vestida do véu de Maya. Olhos em labaredas de ira. Mãos estendidas em gesto de carinho. Fatal.
Abraço de Tamanduá, como diz meu avô. Expressão melhor, haveria não. Gentes assim é espécime em extinção não. Nem às vias de ser extinta. Andam por aí. As pencas.
Das querências do dia, quero é olho de garimpeiro, Senhor.
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Cecília Braga